terça-feira, 13 de novembro de 2012


“CHICO PAIVA” E SEUS AFORISMOS SURPRENDENTES

Após saborear no almoço uma pesada costela – aliás, diga-se de passagem, bastante gorda -, tomei um copo d’água, retirei-me da mesa e aproximei-me do velho sofá para tirar uma sesta, ao sentar comecei a relembrar, casualmente, os primeiros momentos como universitário na nossa singular UFMA – prédio alugado que servira anos a fio ao antigo CRUTAC -, sob a Coordenação da professora Iramary de Jesus Queiroz; naquele momento nos conhecíamos vagarosa e timidamente, aos poucos íamos aproximando um do outro, tentando absorver informações de ordem pessoal e, assim, iniciar uma relação de amizade, cumplicidade e identificação. Ao mesmo tempo, nos entregávamos de corpo e alma, por pura paixão aos textos pré-selecionados pelos nossos professores ‘relâmpagos’ (que, dispunham de um interstício na UFMA e, imediatamente, eram designados para nossa cidade para ministrar as disciplinadas do Curso de Pedagogia) e, lógico, nós vibrávamos com cada disciplinada conquistada! Tempo de aprendizagem e sofrimento pela demora entre uma disciplina e a subseqüente! Tirando esse gigantesco intervalo, valeu apena cada vitória e avanço.
Foi nesse processo rico de participação, envolvimento, e muita, mas muita alegria que conheci o talentoso camarada ‘Chico Paiva’. ‘Chico Paiva’ é um camarada detentor de uma rara qualidade: a amizade fácil e dócil. É um sujeito histórico categórico, sem exagero! Imprime, sucintamente, opiniões demolidoras, sem, no entanto, demonstrar ódio, inveja, antipatia, competitividade e falsidade. A sua marca irretocável manifesta-se, aliás, sempre num tom belicoso e irônico. É seu indomável estilo crítico. Uma observação sobre o que acabei de mencionar como virtudes suas, não quero aqui fazer elogios rasgados pura e simplesmente para agradar o seu ego; mas, sim, abrir uma fissura em seu intelecto, considerando sua notável e aguda percepção de mundo. Tal percepção é sentida em cada frase pronunciada sobre os diversos campos da ciência social. No entanto, a virtude que mais aflora em seu fino e arrojado discurso dialético é a transparência da Ética; isso, confesso, é estrondoso! Outra característica presente é a capacidade de transformar o trágico em comédia; o terrível em ameno, mesmo nos casos mais aviltantes e burlescos.
Quando o conheci – nos espaços exprimidos do Campus VII -, era como eu, um iniciante, um pouco arredio, sempre observador, de frases curtas e de efeitos delirantes.
Mas, permita-me aqui, aduzir o fato que tem uma correlação intima com o ‘Chico Paiva’, enquanto aprendiz universitário. Estávamos fazendo uma apresentação de um Seminário de Filosofia e, quando sua equipe foi fazer a apresentação parecia transcorrer tudo bem, mas, no momento em que o ‘Chico Paiva’ usou sua parte, de repente, é sobressaltado por uma frase cujo efeito, nos conduziu a um prazeroso momento de puro gracejo, a frase pronunciada foi: “... e o escambau!” Não pude me conter, armei-me de uma alarmante gargalhada a ponto de todo o resto da turma me acompanhar. Deste inusitado (engraçado) episódio, posteriormente, é que fui tentar compreender a dinâmica de sua fala. Intrigado com o verbete articulado, tive a curiosidade de investigar o seu sentido filológico (etimológico) e, imediatamente, recorri ao pesado e denso classificador/definidor de palavras: o Aurélio. E ao folhear o glossário, encontrei o verbete com a seguinte descrição: escambau. El. s. m. Us. Loc. e o escambau, o escambau. E o escambau. Bras. Gír. E outras coisas, e mais coisas, etc.; o escambau: “Depois você me chama de omisso, de traidor e o escambau” (Silviano Santiago, Stella Manhatan, p. 185). O escambau. Bras. Gír.E o escambau.
Ora, temos aí, uma clara definição do que seja, efetivamente, o sentido filológico do verbete escambau. Ao mesmo tempo em que, nos apresenta uma frase de um escritor demonstrando, dessa forma, sua aplicação. Claro que, na academia verbetes não tão freqüentemente usado pelos especialistas e doutos de carreiras, certamente, afirmarão que o jargão não possui nenhuma relação com a academia. Importa a mim, relatar o fato não como caráter científico, porém, importa frisar a forma como o ‘Chico Paiva’ definiu naquele momento o sentido que, importava na coesão da ideia e do objeto apresentado. Mesmo sendo uma gíria, porém, ela foi dita como quem quisesse utilizar-se de uma justificação plausível e numa perspectiva dialética, ‘outras coisas, e mais coisas e etc’.
Há! ... ‘Chico Paiva’ ... Quanto vale a luta pela democracia, quando temos uma profunda e excessiva compreensão das cercanias do Sistema Dominante que tenta nos aprisionar usando vários recursos, inclusive, a nossa própria condição intelectual? Quanto vale a luta por parte da sociedade em defesa de uma Universidade Pública de qualidade e a serviço do povo? Será que, ao usar uma metalinguagem complexa seremos capazes de interromper um ciclo histórico secular invertendo sua lógica teórico-ideológica e colocá-la a serviço da comunidade?                      
 ‘Chico Paiva’, camarada, intelectual desproporcional mantenha esse vigoroso estilo crítico que se distancia do tradicionalismo e do conservadorismo intelectual. Edificai o teu próprio caminho, íngreme, porém, denso e irradiador, sem temor e tremor diante de homens acaçapados que é a nossa vergonha.
Nesta pequena nota quis homenageá-lo de uma forma única que sei: usando a pena. Tanto você quanto eu, e, mais ainda, a elite dominante sabe do poder que a pena possui, basta a penas que o povo se deleite com a nossa capacidade teórica e prática e sirva-se desse banquete dialético.
Há! ‘Chico Paiva’... sei o quanto és talentoso e ávido, sedento de conhecimento. Você é um fato concreto de que é possível sim, vencer pelo poder do conhecimento. A educação é um grande instrumento para promover a cidadania de que deseja e quer resgatar a si mesmo do processo de dominação do Sistema. Você é o retrato típico de um vencedor entre os vencidos que não querem levantar suas sobrancelhas e franzir suas testas e libertar-se do jugo da opressão política, econômica, social, cultural e etc.
“escambau”, você é a síntese viva da possibilidade e do possível. De nada adianta ao homem ser abjeto, quando na verdade, ele deve ser a própria existência da superação em todos os sentidos, uma constante construção teórico-libertária. ‘Escambau’ zele por vosso critério da decência e da verdade e nada o derrubará. O homem é isso, só a coragem e a vontade de superar obstáculos e superar-se, sempre!